domingo, 22 de abril de 2012

Tramas do Sagrado: A Civilização Maia no Despertar das Abordagens Arqueológicas.




Gênesis Naum de Farias¹*

Lennon Oliveira Matos ²*

¹*Professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF
²*Acadêmico de Arqueologia da Universidade Federal do Vale do São Francisco.


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Forma de citar 

FARIAS, Gênesis Naum de. MATOS, Lennon Oliveira. Tramas do Sagrado: A Civilização Maia no Despertar das Abordagens Arqueológicas. São Raimundo Nonato/PI, 22 de Abril de 2012. 


RESUMO 

O que segue é uma rápida abordagem em torno dos discursos sobre o despertar da Civilização Maia; suas primeiras tecnologias, tendo como pano de fundo os conceitos de Roger Lewin; tentando evidenciar através de novas descobertas, a relação dos Maias com os Deuses. O objetivo deste trabalho é tentar montar a “concha de retalhos” do objeto de estudos, que pretende compreender as tramas do sagrado, na tentativa de encontrar novos conceitos e uma maior perspectiva para as abordagens relacionada à prática religiosa.

Palavras-Chave: Arqueologia; Civilização; Evolução; Religião; Tecnologia.


Apresentação

A relação dos povos Ameríndios com os Deuses não é um fato recente, muitos estudiosos já o tem se debruçado sobre as questões subjetivas que envolvem a relação do homem com o mundo dos mortos e com o Cosmo. Nestes estudos há um apelo por significados que se manifestam intensamente através de personagens, enredos, cenários ─; histórias que buscam recuperar mitos, resgatar a força de um imaginário rico em descobertas.
Um desses contextos acaba de se ser decifrado por Arqueólogos na Guatemala. Trata-se de um mural de 2000 mil anos no qual os Maias homenageiam deuses e reis. Essa descoberta amplia ainda mais a relação desta Civilização com o Sagrado, mostrando uma gama de referências intersubjetivas que há entre os senhores da terra e do céu.
O produto final do texto que segue, pretende dialogar com os diversos olhares sobre as tecnologias utilizadas para a concepção das pinturas e, se preocupa com a elevada utilização de textos referenciais através de cortes históricos amplos para demarcar as fronteiras do discurso arqueológico. Portanto, o que é citado pretende elaborar um breviário panorâmico das abordagens discursivas numa perspectiva similar.


Introdução 

O Renascimento trouxe a tona não só a concepção de um novo homem em uma sociedade antropocêntrica, mas uma gama de outras acontecimentos que favoreceu à História elementos para se produzir “um outro mundo”. A conquista de outras terras deu essa clareza e a conquista espanhola em especial, trouxe ao panorama cultural da Civilização Moderna reflexos de outro padrão de etos civilizatório. Esta por sua vez não poderia deixar de ser pensada, também, a luz do que representou a relação do homem com a antiguidade greco-romana.
Essas conquistas fariam do homem europeu um desbravador de acontecimentos capaz de produzir graus interruptos de interpretação. Uma delas ocorre na América do Sul, quando no planalto mexicano se tem a descoberta brilhante da Civilização Maia. Essa complexa civilização indígena possuía uma relação muito íntima com o Cosmo e era possuidora de um complicado sistema de escrita glífica, na qual se identificavam mais de 800 caracteres distintos.
Era uma Civilização altamente avançada que dominava conhecimentos extraordinários; que possuíam uma relação com o transcendente (infinito) muito forte. Essa Civilização era os Maias, e sua posição na Mesoamérica é parte de uma fenomenologia bastante estudada por ciências como a Arqueologia que sistematicamente, explora o imagético acumulando hipóteses para melhor entender o laborioso acúmulo de conhecimentos empreendido pelo Império Maia.
Nestas tramas imagéticas, aparece a relação com o Sagrado e a descoberta de um Dresden Códex, do século XIII, vindo a ampliar tal reflexão. As pinturas do incrível manual deixam evidente a eminente exuberância desta Civilização, escondida nas cidades protegidas pela floresta deusa, que fazia homenagens diversas entre o divino e o terreno.
A reflexão sobre o Sagrado e a criação artística desenvolvida por esta Civilização se movimenta em sentido contrário ao entendimento moderno, instalado no século XVIII, visto que são intensos os elos entre o que pode se denominar sacralizado e em comunhão com o divino e o que pode ser apenas representado como um fato cultural. Há nesta perspectiva uma relação existencial que está presente na própria manifestação do ser humano, ou seja, entre o revelar-se e revelar-se na dramatização própria da linguagem “atemporal” indiferente aos cânones produzidos pelo pensamento eurocêntrico.
Portanto, coube ao europeu conquistar e impor sua estética moderna, porém o trabalho com a imagem e os monumentos só deixaram claros que os deuses por ela falam. As descobertas no sítio de San Bartolo, na Guatemala, falarão de um Sagrado que já era dominado por uma Civilização há mais de 2000 mil anos.


A Pesquisa 

San Bartolo fica ao norte de Tikal e pertenceu ao país da América Central onde outrora estava localizado à Mesoamérica. Neste país, Arqueólogos acharam uma tumba Maia que foi datada em cerca de 150 a.c. O túmulo fica no lado oeste de San Bartolo. A leste deste sítio foram achados duas salas do ano 100 a.c. Ao lado de uma pirâmide oculta por uma construção, feita posteriormente, se descobriu um mural Maia, narrando feitos divinos e reais. (SATURNO, 2005).


O Contexto 

O próprio Saturno evidencia a fala da Arqueóloga Mônica Pellecer Alécio para enfatizar a importância do trabalho arqueológico: “O projeto teve início em março de 2001 com um golpe de sorte, de pura sorte, quando entrei numa trincheira que ladrões saqueadores haviam aberto na pirâmide. Meu olhar pousou no rosto de um deus de milho olhando por cima de uma donzela. (...) Em 2003, comecei a cavar o túnel, comecei a cavar um túnel para dentro da sala do manual (...)”. A pesquisadora evidencia a importância da escavação para poder salvaguardar o que ainda restava de vestígios e acabou se deparando com algo que mudaria a leitura do processo: o mural Maia. A importância de San Bartolo para esse despertar Maia como uma trama para se entender o Sagrado, se coloca como um grande livro aberto para narrar outros aspectos da história da relação das Maias com o Cosmo.   


O Artefato 

O Dresden Códex é datado do século XIII e reflete pinturas que contam histórias com a mesma gratificação obtida por obras clássicas da arte moderna. Trata-se de painéis que falam de oferendas de sangue e coroações. Marcam o nascimento da Cosmologia Maia; sua relação com o Direito Divino dos Reis e seus sacrifícios.
O acervo foi digitalizado em 350 pequenos setores, criando um grande painel que ilustra em linhas originais, o que ficou escondido cerca de 2000 mil anos. Ao todo são 42 painéis que configuram a formidável mensagem de um passado sagrado e desmembrado pela conquista espanhola. “Will Saturno usou scanner para digitalizar fragmentos do mural no lugar original”.


A Escavação 

A escavação na sala mural começou na parede norte – documentada pela NATIONAL – e mostrou que a união dos fragmentos (digitalizados) revelaria temas da crença Maia que atravessaram mais de dois milênios. O Sagrado nestes painéis refaz conjunções que ajudaram a ligar a Terra e o Céu numa trama que ordenava sacrifícios com colheitas, adoração com coroação, etc.
O mural de San Bartolo mostra um ciclo de divindades compondo árvores sagradas que ordenam o mundo. “(...) o Dresden Códex, do século XIII, é a prova da continuidade do simbolismo religioso Maia. Pouco resta do quinto deus, à direita dos sacrifícios, mas parece ser o do milho, uma das principais divindades (...)”
De fato, há na associação natureza-cosmo uma profunda intimidade onde reis ordenavam tudo com a permeação do Cosmo: edifício, ruas, monumentos, cidades, etc.
O mural celebra a ascensão e narra o paralelo entre a vida e os ciclos agrícolas. Na verdade o deus do milho coroava a si como representante legal da governança. Nisto, os reis herdavam dos pais “(...) o direito de soberania, mas este, ao mostrar-se em companhia divina, pode estar afirmando que recebe tal direito dos próprios deuses (...). (SATURNO, 2005 p. 83).


A Historicidade do Mundo Perdido 

O mural Maia guarda muitas surpresas. Os estudiosos da questão acreditam que naquele estágio antigo da História dos Maias, as cidades-estado ainda não haviam se desenvolvido plenamente. O fato é que alguns quilômetros daquele local há uma tumba Maia de um rei de verdade, afirma a Arqueóloga, guatemalteca Mônica Pellecer Alécio. A mesma afirma: “Debaixo da tumba, havia a ossada de um homem e oferendas, como uma tigela em forma de sapo e um vaso com a efígie do Chac, o deus da chuva”.
O importante é pensar que depois de 2000 mil anos, o poder sacralizado dos deuses unia os ciclos das chuvas, também as colheitas, fertilidades e tempestades na mesma comunhão com a força da subjetividade que se emprega ao feito. O império Maia viveu em suas origens o impacto Olmeca, os primórdios da vida sedentária desenvolvida a partir da agricultura.
Foi uma Civilização que se desenvolveu nas Terras Baixas, dominava a astronomia e possuía um calendário e uma escrita. Teve um despertar clássico, viveram sob uma “idade do ouro” e tiveram um declínio também Clássico num período Pós-Clássico. A territorialidade espacial do império Maia somava a cifra de 325 mil quilômetros quadrados “que abrangia cinco estados do México atual, quase toda a Guatemala, parte de El Salvador, parte de Honduras e Belise.”.
Paul Grendop descreve ainda o período formativo ( 2500 a.c. a 200 a.c.) como um período bastante rico que serviu para nortear a ascensão do império, “(...) com destaque para o impacto Olmeca nos antecedentes da Civilização Maia,e concentra-se então nas diversas fases do período clássico, o qual culmina com a Idade do Ouro dos Maias(...)”.
È importante levar em consideração a fase do declínio do império Maia, pois a fase que corresponde à absorção mexicana é apoiada em questões ligadas a organização e sócio-política e a economia.


O Sagrado 

Ao analisar a importância de San Bartolo para a pesquisa em curso e em estudo, se percebeu que para se chegar à noção das tramas que se empregam ao sagrado foi privilegiado o aspecto “não-racional” do Sagrado, ou numinoso. As tramas, tecidas pela Civilização Maia, mostraram um sagrado plural, mestiço, hibrido, opulente, vigoroso ─; seguindo a orientação de determinada crença. No geral, o mural Maia (Dresden Códex) é uma construção imagética que possui tramas textuais que falam através da política com arte, pluralidade e pensamento.
Enfim, as Tramas do Sagrado permeiam lugares em que tanto a sacralidade quanto o profano reafirmam suas marcas genealógicas, consistindo numa abordagem que privilegiada a vida religiosa e sincrética como também os elementos que reúnem o fantástico e o maravilhoso.


Considerações Finais 

Os estudos mostram que a todo instante multiplicam-se as interpretações sobre a invenção de quadros explicativos e classificações, com ênfase na História das Arqueologias, e que as uniformidades tendem a conceituar as derivadas noções da cultura elaborada pela Civilização Maia para um plano menos homogeneizado, onde os discursos sobre o Sagrado começam a ser assimilados como procedimentos herméticos, indispensáveis para a crítica das práticas interpretativas, no interior dos pressupostos discutidos pelos estudiosos. Pedro Paulo Funari diria que essa última instância das pesquisas arqueológicas evidenciaria a pluralidade e a conseqüente convivência da variedade com o sagrado, passando a construir aspectos de um mundo também caracterizado pelas diferenças.  


Para Saber Mais: 

GENDROP, Paul. A Civilização Maia. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.

SATURNO, Willian. “O Despertar Maia: Deuses e Reis.” In: International Geographic/ Brasil- Março, 2005 p 76/85.

DOYLE, Arthur Conan. O Mundo Perdido. – São Paulo: CEN, 2005.

LEWIN, Roger. Evolução Humana. – São Paulo: Atheneu Editora, 1999.

_____. “As primeiras Tecnologias de Fabricação de Ferramentas.” In: Evolução Humana. – São Paulo. Atheneu Editora, 1999. p. 309/321.

_____. “Novas Tecnologias”. In: Evolução Humana. – São Paulo. Atheneu Editora, 1999. p. 343/349.
         








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