Gênesis
Naum de Farias¹*
Lennon
Oliveira Matos ²*
¹*Professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF
²*Acadêmico de Arqueologia da Universidade Federal do Vale do São Francisco.
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Forma de citar
FARIAS, Gênesis Naum de. MATOS,
Lennon Oliveira. Tramas do Sagrado: A
Civilização Maia no Despertar das Abordagens Arqueológicas. São Raimundo Nonato/PI, 22 de Abril de 2012.
RESUMO
O que segue é uma rápida abordagem em torno dos
discursos sobre o despertar da Civilização Maia; suas primeiras tecnologias,
tendo como pano de fundo os conceitos de Roger Lewin; tentando evidenciar
através de novas descobertas, a relação dos Maias com os Deuses. O objetivo
deste trabalho é tentar montar a “concha de retalhos” do objeto de estudos, que
pretende compreender as tramas do sagrado, na tentativa de encontrar novos
conceitos e uma maior perspectiva para as abordagens relacionada à prática
religiosa.
Palavras-Chave: Arqueologia;
Civilização; Evolução; Religião; Tecnologia.
Apresentação
A
relação dos povos Ameríndios com os Deuses não é um fato recente, muitos
estudiosos já o tem se debruçado sobre as questões subjetivas que envolvem a
relação do homem com o mundo dos mortos e com o Cosmo. Nestes estudos há um
apelo por significados que se manifestam intensamente através de personagens,
enredos, cenários ─; histórias que buscam recuperar mitos, resgatar a força de
um imaginário rico em descobertas.
Um
desses contextos acaba de se ser decifrado por Arqueólogos na Guatemala.
Trata-se de um mural de 2000 mil anos no qual os Maias homenageiam deuses e
reis. Essa descoberta amplia ainda mais a relação desta Civilização com o
Sagrado, mostrando uma gama de referências intersubjetivas que há entre os
senhores da terra e do céu.
O
produto final do texto que segue, pretende dialogar com os diversos olhares
sobre as tecnologias utilizadas para a concepção das pinturas e, se preocupa
com a elevada utilização de textos referenciais através de cortes históricos
amplos para demarcar as fronteiras do discurso arqueológico. Portanto, o que é
citado pretende elaborar um breviário panorâmico das abordagens discursivas
numa perspectiva similar.
Introdução
O
Renascimento trouxe a tona não só a concepção de um novo homem em uma sociedade
antropocêntrica, mas uma gama de outras acontecimentos que favoreceu à História
elementos para se produzir “um outro mundo”. A conquista de outras terras deu
essa clareza e a conquista espanhola em especial, trouxe ao panorama cultural
da Civilização Moderna reflexos de outro padrão de etos civilizatório. Esta por
sua vez não poderia deixar de ser pensada, também, a luz do que representou a
relação do homem com a antiguidade greco-romana.
Essas
conquistas fariam do homem europeu um desbravador de acontecimentos capaz de
produzir graus interruptos de interpretação. Uma delas ocorre na América do
Sul, quando no planalto mexicano se tem a descoberta brilhante da Civilização
Maia. Essa complexa civilização indígena possuía uma relação muito íntima com o
Cosmo e era possuidora de um complicado sistema de escrita glífica, na
qual se identificavam mais de 800 caracteres distintos.
Era
uma Civilização altamente avançada que dominava conhecimentos extraordinários;
que possuíam uma relação com o transcendente (infinito) muito forte. Essa
Civilização era os Maias, e sua posição na Mesoamérica é parte de uma
fenomenologia bastante estudada por ciências como a Arqueologia que sistematicamente,
explora o imagético acumulando hipóteses para melhor entender o laborioso
acúmulo de conhecimentos empreendido pelo Império Maia.
Nestas
tramas imagéticas, aparece a relação com o Sagrado e a descoberta de um Dresden
Códex, do século XIII, vindo a ampliar tal reflexão. As pinturas do
incrível manual deixam evidente a eminente exuberância desta Civilização,
escondida nas cidades protegidas pela floresta deusa, que fazia homenagens
diversas entre o divino e o terreno.
A
reflexão sobre o Sagrado e a criação artística desenvolvida por esta
Civilização se movimenta em sentido contrário ao entendimento moderno,
instalado no século XVIII, visto que são intensos os elos entre o que pode se
denominar sacralizado e em comunhão com o divino e o que pode ser apenas
representado como um fato cultural. Há nesta perspectiva uma relação
existencial que está presente na própria manifestação do ser humano, ou seja,
entre o revelar-se e revelar-se na dramatização própria da linguagem
“atemporal” indiferente aos cânones produzidos pelo pensamento eurocêntrico.
Portanto,
coube ao europeu conquistar e impor sua estética moderna, porém o trabalho com
a imagem e os monumentos só deixaram claros que os deuses por ela falam. As
descobertas no sítio de San Bartolo, na Guatemala, falarão de um Sagrado que já
era dominado por uma Civilização há mais de 2000 mil anos.
A Pesquisa
San
Bartolo fica ao norte de Tikal e pertenceu ao país da América Central onde
outrora estava localizado à Mesoamérica. Neste país, Arqueólogos acharam uma
tumba Maia que foi datada em cerca de 150 a.c. O túmulo fica no lado oeste de San
Bartolo. A leste deste sítio foram achados duas salas do ano 100 a.c. Ao lado de uma
pirâmide oculta por uma construção, feita posteriormente, se descobriu um mural
Maia, narrando feitos divinos e reais. (SATURNO, 2005).
O Contexto
O
próprio Saturno evidencia a fala da Arqueóloga Mônica Pellecer Alécio para
enfatizar a importância do trabalho arqueológico: “O projeto teve início em
março de 2001 com um golpe de sorte, de pura sorte, quando entrei numa
trincheira que ladrões saqueadores haviam aberto na pirâmide. Meu olhar pousou
no rosto de um deus de milho olhando por cima de uma donzela. (...) Em 2003,
comecei a cavar o túnel, comecei a cavar um túnel para dentro da sala do manual
(...)”. A pesquisadora evidencia a importância da escavação para poder
salvaguardar o que ainda restava de vestígios e acabou se deparando com algo
que mudaria a leitura do processo: o mural Maia. A importância de San Bartolo
para esse despertar Maia como uma trama para se entender o Sagrado, se coloca
como um grande livro aberto para narrar outros aspectos da história da relação
das Maias com o Cosmo.
O Artefato
O
Dresden Códex é datado do século XIII e reflete pinturas que contam histórias
com a mesma gratificação obtida por obras clássicas da arte moderna. Trata-se
de painéis que falam de oferendas de sangue e coroações. Marcam o nascimento da
Cosmologia Maia; sua relação com o Direito Divino dos Reis e seus sacrifícios.
O
acervo foi digitalizado em 350 pequenos setores, criando um grande painel que
ilustra em linhas originais, o que ficou escondido cerca de 2000 mil anos. Ao
todo são 42 painéis que configuram a formidável mensagem de um passado sagrado
e desmembrado pela conquista espanhola. “Will Saturno usou scanner para
digitalizar fragmentos do mural no lugar original”.
A Escavação
A
escavação na sala mural começou na parede norte – documentada pela NATIONAL – e
mostrou que a união dos fragmentos (digitalizados) revelaria temas da crença
Maia que atravessaram mais de dois milênios. O Sagrado nestes painéis refaz
conjunções que ajudaram a ligar a Terra e o Céu numa trama que ordenava
sacrifícios com colheitas, adoração com coroação, etc.
O
mural de San Bartolo mostra um ciclo de divindades compondo árvores sagradas
que ordenam o mundo. “(...) o Dresden Códex, do século XIII, é a prova da
continuidade do simbolismo religioso Maia. Pouco resta do quinto deus, à
direita dos sacrifícios, mas parece ser o do milho, uma das principais
divindades (...)”
De
fato, há na associação natureza-cosmo uma profunda intimidade onde reis
ordenavam tudo com a permeação do Cosmo: edifício, ruas, monumentos, cidades,
etc.
O
mural celebra a ascensão e narra o paralelo entre a vida e os ciclos agrícolas.
Na verdade o deus do milho coroava a si como representante legal da governança.
Nisto, os reis herdavam dos pais “(...) o direito de soberania, mas este, ao
mostrar-se em companhia divina, pode estar afirmando que recebe tal direito dos
próprios deuses (...). (SATURNO, 2005 p. 83).
A Historicidade do Mundo Perdido
O
mural Maia guarda muitas surpresas. Os estudiosos da questão acreditam que
naquele estágio antigo da História dos Maias, as cidades-estado ainda não haviam se desenvolvido plenamente. O fato é que
alguns quilômetros daquele local há uma tumba Maia de um rei de verdade, afirma
a Arqueóloga, guatemalteca Mônica Pellecer Alécio. A mesma afirma: “Debaixo
da tumba, havia a ossada de um homem e oferendas, como uma tigela em forma de
sapo e um vaso com a efígie do Chac, o deus da chuva”.
O
importante é pensar que depois de 2000 mil anos, o poder sacralizado dos deuses
unia os ciclos das chuvas, também as colheitas, fertilidades e tempestades na
mesma comunhão com a força da subjetividade que se emprega ao feito. O império
Maia viveu em suas origens o impacto Olmeca, os primórdios da vida sedentária
desenvolvida a partir da agricultura.
Foi
uma Civilização que se desenvolveu nas Terras Baixas, dominava a astronomia e
possuía um calendário e uma escrita. Teve um despertar clássico, viveram sob
uma “idade do ouro” e tiveram um declínio também Clássico num período
Pós-Clássico. A territorialidade espacial do império Maia somava a cifra de 325
mil quilômetros quadrados “que abrangia cinco estados do México atual, quase
toda a Guatemala, parte de El Salvador, parte de Honduras e Belise.”.
Paul
Grendop descreve ainda o período formativo ( 2500 a.c. a 200 a.c.) como um período
bastante rico que serviu para nortear a ascensão do império, “(...) com
destaque para o impacto Olmeca nos antecedentes da Civilização Maia,e
concentra-se então nas diversas fases do período clássico, o qual culmina com a
Idade do Ouro dos Maias(...)”.
È
importante levar em consideração a fase do declínio do império Maia, pois a
fase que corresponde à absorção mexicana é apoiada em questões ligadas a
organização e sócio-política e a economia.
O Sagrado
Ao
analisar a importância de San Bartolo para a pesquisa em curso e em estudo, se
percebeu que para se chegar à noção das tramas que se empregam ao sagrado foi
privilegiado o aspecto “não-racional” do Sagrado, ou numinoso. As
tramas, tecidas pela Civilização Maia, mostraram um sagrado plural, mestiço,
hibrido, opulente, vigoroso ─; seguindo a orientação de determinada crença. No
geral, o mural Maia (Dresden Códex) é uma construção imagética que possui
tramas textuais que falam através da política com arte, pluralidade e
pensamento.
Enfim,
as Tramas do Sagrado permeiam lugares em que tanto a sacralidade quanto o
profano reafirmam suas marcas genealógicas, consistindo numa abordagem que
privilegiada a vida religiosa e sincrética como também os elementos que reúnem
o fantástico e o maravilhoso.
Considerações Finais
Os
estudos mostram que a todo instante multiplicam-se as interpretações sobre a
invenção de quadros explicativos e classificações, com ênfase na História das
Arqueologias, e que as uniformidades tendem a conceituar as derivadas noções da
cultura elaborada pela Civilização Maia para um plano menos homogeneizado, onde
os discursos sobre o Sagrado começam a ser assimilados como procedimentos
herméticos, indispensáveis para a crítica das práticas interpretativas, no
interior dos pressupostos discutidos pelos estudiosos. Pedro Paulo Funari diria
que essa última instância das pesquisas arqueológicas evidenciaria a
pluralidade e a conseqüente convivência da variedade com o sagrado, passando a
construir aspectos de um mundo também caracterizado pelas diferenças.
Para Saber Mais:
GENDROP, Paul. A
Civilização Maia. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.
SATURNO,
Willian. “O Despertar Maia: Deuses e Reis.” In: International Geographic/ Brasil- Março,
2005 p 76/85.
DOYLE, Arthur Conan. O
Mundo Perdido. – São Paulo: CEN, 2005.
LEWIN, Roger. Evolução
Humana. – São Paulo: Atheneu Editora, 1999.
_____. “As
primeiras Tecnologias de Fabricação de Ferramentas.” In: Evolução Humana. –
São Paulo. Atheneu Editora, 1999. p. 309/321.
_____. “Novas
Tecnologias”. In: Evolução Humana. – São Paulo. Atheneu Editora, 1999. p.
343/349.