segunda-feira, 31 de maio de 2021

A Contemporaneidade do Místico Plínio Marcos. .

Boletim Informativo do Núcleo de Estudos Foucaultiano. Ano 09 – Nº 0007. Maio/ 2021 – São Raimundo Nonato.



Paper.

FARIAS, Gênesis Naum de. A Contemporaneidade do Místico Plínio Marcos. – São Paulo: Scortecci, 2021. In: Pesquisa em Educação: Estratégias Pedagógicas e Articulações de Saberes / Gênesis Naum de Farias. – São Paulo: Scortecci, 2021. Obra no Prelo.


 Gênesis Naum de Farias.[1]



[1] Professor Auxiliar II do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia na Universidade Estadual do Piauí – UESPI/ Campus Ariston Dias Lima - São Raimundo Nonato, onde coordena o Núcleo de Estudos Foucaultiano. Com formação em Pedagogia e Especialização em Gestão Escolar pela Faculdade Montenegro.


Com a morte dos nossos principais atores shakespearianos, nosso te­atro ficou órfão dos seus maiores representantes, no que tange a busca pela excelência de uma arte que ao longo do tempo se caracterizou como sendo de vanguarda. O ator, afinal, é fruto de uma busca existencial pela consoli­dação de uma expressão artística que integra a cultura nos seus aspectos de fomento a novas linguagens, percepções e representações das várias facetas da realidade ao repensar o panorama do próprio cotidiano através da voz dada a textos literários e dramatúrgicos, que diretamente procuram libertar a matéria dos seus anseios socioculturais. Nesse contexto, é bom lembrar que no dia 19 de Novembro de 1999 o nosso teatro também perdia um escritor como poucos; que deixava sua ausência marcada por uma proposta mais crítica para o próprio teatro através da dramaturgia marginal, de persona­gens que refletiam seus dramas humanos, no gosto da linguagem universal, fazendo com que o público repensasse sua própria condição.

Plínio Marcos de Barros morreu aos 64 anos e deixou sob sua marca uma tra­jetória polêmica, recheada de impedimentos legais que evidenciaram sua obra dentro da moderna dramaturgia brasileira. A atualidade dos seus textos revela os dramas de uma sociedade que insiste em não se preocupar em solucionar os problemas sociais inerentes ao seu desfecho, mas emplacam considerações à textura dos palcos acabando por influenciar a questão cultu­ral do século em que viveu. Plínio Marcos foi muito mais do que uma mera coincidência; foi um movimento, foi um lamento, um texto, uma encenação, pois a atualidade nua e crua era retratada com bastante veemência. Porém, as intenções dos seus escritos não sugeriam uma solução para o ciclo vicioso proposto pela exploração mútua entre as personagens que criava, antes anunciava sua postura artística, antecipando nosso próprio fracasso político. As intenções de sua obra apontam sempre para o mesmo dilema: o combate existencial, sugerindo humanizar o espectador para um presente impessoal, imposto pelas estatísticas do estado das coisas.

Em sua linha teatral, o gosto pelo jogo do poder e a indiferença da sociedade brasileira, brigam lado a lado; era enfim, um dramaturgo magne­tizador que escrevia sobre o grotesco submundo brasileiro como um bruxo diante do intenso conflito verbal da crueldade no seu sentido mais amplo de exclusões. Podemos compará-lo ao cronista carioca João do Rio, que em vida se destinou a dar importância ao mundo dos esquecidos, confirman­do a lira dos que vivem nos cortiços, nos cabarés, em sagas de boemia, na berlinda da vida, no fim da noite, ressaltando a própria alma sonora dos homens como interventores do espaço e do tempo.

Este dramaturgo é herdeiro legítimo, de Nelson Rodrigues. Ambos traduziram muito de suas experiências pessoais para a cena do teatro, pro­movendo um envolvimento autêntico da opressão da sina dos seres huma­nos, veementes excluídos na zona urbana, nos guetos e, em pleno estado de sítio. Eram histórias de prostitutas, homossexuais, assassinos, presos, cafetões, vagabundos e proletários. Em tudo Plínio Marcos buscava es­treitar os laços culturais da densa sociedade urbana, propondo-lhe com sagacidade uma amostra do fracasso como causa para ressignificar a lida. Sua obra mais encenada e a que lhe deu fama, perseguição e o estigma de escritor maldito foi Dois Perdidos Numa Noite Suja, que chegou a ser com­parada ao texto Esperando Godot de Samuel Beckter, e nela dois persona­gens marginais – Paco e Tonho despem as máscaras da humanidade em seu estado de solidão, afetos, violências e crueldades. Ao longo da vida deixou obras que podem causar calafrios com sua desenvoltura política, porque foi vítima de prisões, censuras, boicotes e inúmeros maus tratos muito bem representados na sociedade dos excluídos. Navalha na Carne e Abajur Lilás abordam as vítimas da prostituição; Homens de Papel, Barrela e Quando as Máquinas Param descrevem os dramas das carceragens; Madame Blavastsky, Jesus Homem e Balbina de Iansã descrevem seu lado mais religioso e, Bala­da de um Palhaço e o Assassinato do Anão do Caralho Grande remontam sua origem circense.

A crônica maldita de Plínio Marcos se relaciona à crueza dos seus textos, apontando para a maturidade de um dramaturgo sempre indignado pela forte condição que a humanidade desencadeia seus sofisticados confli­tos psicológicos. No geral, a obra teatral de Plínio Marcos era recheada de palavrões que ressaltam o embrutecimento das mais recatadas classes, para as quais não tinha restrições. Afinal, Plínio escolheu sua própria subversão e foi aquém a todas as aberturas, quando equivocava a política de forma a deturpar o seu sentido real, deixando um bordão e um segredo para a dramaturgia brasileira: o grande segredo da dramaturgia é contar uma histó­ria de forma clara. Plinio não fazia concessões...

            Que os anos de ausência nos envolvam neste fascinante teatro da re­alidade, onde Plínio Marcos nunca esteve ausente nem será útil pensá-lo postumamente, porque sua literatura marginal se faz presente neste jogo de sombras, onde a contemporaneidade dialoga com o efêmero nos deixando uma nostalgia de que nossa postura de humildade revelará uma revolução que precisa começar no tempo presente, na ética do presente, na crônica do presente, que nos dizeres do próprio Plínio precisamos nos perguntar o que estamos fazendo na terra, para simplesmente não passarmos por ela como se estivéssemos acompanhando um enterro. Que a nossa saudade seja fruto de um adeus entoado em todos os eventos da classe teatral!

 

 

segunda-feira, 24 de maio de 2021

Educação, Sociedade e Contemporaneidade: Os novos rumos da Educação para o Século XXI.

  Boletim Informativo do Núcleo de Estudos Foucaultiano. Ano 9 – Nº 0006. Maio/ 2021 – São Raimundo Nonato.



Ensaio. 

FARIAS, Gênesis Num de; FARIAS, Enos André de. (Org.s). "Educação, Socidade e Contemporaneidade: Os novos rumos da Educação para o século XXI". In: Ensaios de Pesquisa em Educação. – Paulo Afonso/BA: Oxente, 2021. Prefácio do Livro.


Gênesis Naum de Farias.

Professor Auxiliar II do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia na Universidade Estadual do Piauí – UESPI/ Coordenador do Núcleo de Estudos Foucaultiano.

 

Enos André de Farias.

                              Mestre em Educação, Cultura e Territórios Semiáridos./ Doutorando em Educação pela Universidade do Estado da Bahia – UNEB/DCH III.



Muito se fala atualmente, sobre a nova sociedade que se estrutura para o século XXI e para os séculos seguintes. Aqui se assume o compromisso de discutir as questões que interessam às mudanças cruciais ocorridas nas últimas décadas no território da Educação Básica, que trazem consigo a necessidade de se repensar de forma profunda a estrutura das inúmeras instituições de ensino. Para isso, abordar-se-á imediatamente o que faz deste início de milênio um período tão singular: as simultâneas revoluções tecnológicas e o acesso massificado à informação. A seguir, serão analisados os efeitos desses fatores nas instituições de ensino.

Primeiro, torna-se importante pensar quem são os atores que compõe o cenário da Educação no Brasil, que papel exerce nos ditames dessa educação quando os interesses nacionais são colocados e confrontados com o cenário internacional. O Brasil possui um lugar de destaque como componente do BRIC (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), oscilando entre a 9º e a 6ª economia mundial, enfrentando o desafio de avançar internamente sob uma situação real que já dispõe de dados colocados por pesquisas, relacionadas ao ensino e pesquisa como atividades que reconhecem na qualidade a necessidade de avançar com relevância significativa.

É provável o reconhecimento em torno do esforço de avançar pela reestruturação, expansão e consolidação dos Institutos de Ensino, das Universidades, das políticas de formação continuada para a Educação Básica, repensando salário, carreira e promoção docente, porém as reações práticas a esses avanços na realidade sócio-política dos ambientes educacionais têm demonstrado objetivamente que Educação não é a prioridade significativa para o país. Que futuro se pretende como identidade de Nação, um país que trata com descaso e atitude descompromissada a situação da sua Educação? “[...] Seremos no futuro um país miserável com uma economia caminhando para despontar na lista dos primeiros mundos, porém donos de uma nação listada por semianalfabetos que afirma numericamente que avançou, criou possibilidades de aumento no número de vagas abertas para qualificar discentes através de números que não condizem com a realidade qualitativa de um forte compromisso com o futuro. Esse contexto resvala na questão de quem faz diretamente os procedimentos técnicos para se financiar e gerir as políticas públicas de Educação.”. (Manifesto dos Educadores da UNIVASF em prol de políticas de Educação de Qualidade, 2011).

No geral o que se percebe publicamente é a ingerência de economista supervalorizando e quantificando dados, políticos definindo as metas de projeção e os educadores sendo deixados de lado quando o assunto é pensar valores para melhorar o cotidiano nas escolas através de políticas de inclusão e qualificação. Lacan enfatiza: “[...] Só é ensino verdadeiro aquele que consegue despertar uma insistência naqueles que escutam, este desejo de saber que só pode surgir quando eles próprios tomarem a medida da ignorância como tal – naquilo em que ela é, como tal, fecunda – e isto também vale para aquele que ensina.”. (1985, p. 260). Portanto, falar de Educação é basicamente trabalhar com o conhecimento.

O homem moderno vive numa época em que a produção do conhecimento tornou-se crucial para o desenvolvimento econômico e social. Conceitos como sociedade do conhecimento, economia do conhecimento, gestão do conhecimento e sociedade aprendente são amplamente utilizados para caracterizar a sociedade do século XXI como uma sociedade relativa à informação. Contudo, a educação nacional está em crise porque não se preocupa com as prioridades que servem para elevar a autoestima e ampliar as aprendizagens a um patamar que dê formação e conhecimento suficiente a toda a população para enfrentar as dificuldades oriundas da inserção dos novos saberes em uma globalidade de acontecimentos que atende pelas novas tecnologias inserida no mundo real.

Os indivíduos necessitam de informações para poder sobreviver num mundo gerenciado por tecnologias que a cada novo dia se renova, se aperfeiçoa. Então, como se podem formar homens para enfrentar esse novo padrão de vida? Desde a Revolução Industrial, na Inglaterra, que o ser humano passou a disputar com máquinas um lugar no mercado de trabalho. Esse mesmo homem está inserido na chamada era da revolução tecnológica, onde a máquina se modernizou, foi aperfeiçoada e começa assumir o lugar de milhares de homens no mercado produtivo. Com isso, os conceitos de educação tiveram que mudar.

Dilemas são enfrentados todos os dias no ambiente das salas de aula e, um dos mais complexos é o fato do educador muitas vezes não dominar uma prática discursiva coerente com seus anseios políticos, que lhe dê motivação para enfrentar problemas básicos como: pouca familiaridade com o ambiente escolar; falta de prática pedagógica e contato insuficiente com as diversas modalidades de ensino. O processo educativo só se transforma em prática consciente quando o educador reflete sobre suas concepções e é capaz de justificá-las para a comunidade em que está inserido.

Um dos grandes obstáculos para que se alcance esse objetivo são tornar claro para todos os educadores quais são os pressupostos epistemológicos em que se fundamentam suas crenças a respeito da educação. No entanto, há um perfil que vem sendo anunciado para o educador do futuro que atende pelas premissas do projeto de ressignificação e ampliação do papel do educador na educação básica. Essa discrepância entre o discurso e a prática demonstra que nem todas as ações operacionalizadas no ambiente escolar são frutos de uma posição política fundada em parâmetros críticos.

É preciso superar essa prática comum que impera em muitas instituições de ensino. O fato é que muitas vezes o discurso oficial só cobra o compromisso de quem educa ou está na função de educador, fazendo dos paradigmas emergentes, que envolvem esses educadores, os maiores responsáveis pela não transformação do contexto real da sala de aula, porém é preciso atentar-se ao preceito que diz que quando um esquema cognitivo torna-se inadequado para dar sentido ao mundo, ele é substituído por outro.

Portanto o novo perfil pensado para o educador do milênio atende por alguns enunciados técnicos que perfazem a lógica cultural da Educação pelo educador. São eles: a) boa formação: buscar permanentemente a qualificação; b) uso das novas tecnologias: utilizá-las como recurso a favor dos conteúdos; c) utilizar-se das novas didáticas: buscando um jeito novo de ensinar cada componente curricular; d) trabalhar em equipe e trocar ideias; e) planejar e avaliar sempre observando as reorientações do trabalho pedagógico); f) postura profissional: voltada para o protagonismo social. Esse é o paradigma do professor pesquisador que se atem as habilidades e competências e as colocam a serviço da lógica educativa como um elemento de profissionalização dos saberes no ofício docente. (MARTINS; MOÇO, 2010).

Essa tendência lança as bases econômicas-pedagógicas para uma renovação produtiva que não se atém a repetir as concepções analíticas e tecnicistas dos anos 70 e 80, mas quer traçar outros cenários para a própria formação da Educação Básica. O estudo das competências fez de Philippe Perrenoud, o autor, nessa área, mais lido por parte dos indicadores nacionais. Para ele, a noção de competência se equipara a capacidade de utilizar saberes para agir em diversas situações, onde, desde o nascimento, os sujeitos trazem em si alguns processos de maturação como elementos que serão desenvolvidos em forma de aprendizagens ao longo das fases da vida, e que são preparadas para adaptarem-se às diferentes situações que a própria vida os permitir.

Ainda na década de 1970, uma nova pedagogia tornou-se realidade no Brasil: A Educação Tecnicista. Essa nova tendência pedagógica tinha como objetivo formar os estudantes brasileiros para o trabalho nas indústrias e no comércio. Escolas Técnicas foram criadas, uma nova proposta pedagógica foi inserida e o antigo segundo grau foi dividido em estudos gerais, para formar estudantes que enfrentariam o vestibular e cursos profissionalizantes, a exemplo de técnico em contabilidade e agronomia, para aqueles que enfrentariam o mercado de trabalho. Essa tendência no Brasil, com o fim de regime militar, também foi extinta, pois o retorno da democracia e o avanço cada vez maior das tecnologias requeriam alunos preparados psicologicamente e didaticamente para viver em sociedade e para o mercado de trabalho, permitindo a participação efetiva em três esferas: o setor produtivo, a sociedade civil e os processos políticos.

Nisto, é importante lembrar que o discurso emancipatório da Modernidade se baseia na apropriação conceitual de dois pilares: a) a vigência da sociedade do trabalho; b) a justificativa da existência do ser social como um sujeito consciente de sua individualidade, mas que não se priva do convívio em sociedade. Por isso esse projeto de emancipação humana fracassou, por se concentrar apenas no processo técnico, tendo como resultado final a degradação social. As novas competências, lançadas pelos teóricos para enfrentarem a situação exposta, exige da sociedade do conhecimento, mais informação e constante aprimoramento.

A partir de 1996, com a aprovação da Lei Nº 9.394/96, a conhecida Lei de Diretrizes da Educação Nacional, novas mudanças foram inseridas no contexto educacional brasileiro. E, precisamente, o que nesses tempos se modificou foi a definição da ideia de localidade no mundo, que na contemporaneidade não é mais a noção de que fisicamente se pertence a um país mas à ideia do trabalho em torno do qual se processa a informação acessível a todos que modificou e tomou outros contornos dando uma nova cara às alteridades que compõem o cenário político do trabalho manual pelo intelectual. Essa é a melhor definição do capital cultural processando informação para definir o global pelo capital social.

Para que o cidadão possa assumir o papel de ator nesse novo patamar social, o desenvolvimento das competências se dá pela compreensão de valores sociais e morais oriundos do processo de socialização, num mundo cada dia mais competitivo, perverso e extremamente estressante, envolto numa combinação política e cultural que o leva a diferentes situações. O conhecimento, nesse mundo de múltiplas informações, tornou-se importante para a adaptação da espécie, mas somente o conhecimento técnico não pode mudar suas vidas. É preciso moldar os conhecimentos com novas aprendizagens, preparando a todos para enfrentarem diferentes situações, sendo aluno e professor na escola da vida. Para tanto, é preciso formar professores para a docência que, consequentemente, deem contornos distintos a identidade profissional e as práticas desafiadoras dos professores, ampliando o desenho dos projetos que desejam formar para si e para o mundo, através da educação.

Primeiro, há um projeto a ser modificado que passa pela concepção de homem que se quer permanentemente ser pensado e depois pelo projeto de escola que forma para as aprendizagens significativas, quer seja, pela formação do pensamento intelectual ou das práticas discursivas, que o futuro educador processa já agora, se contrapondo a formação bancária do ensino na zona rural ou urbana. Através do profícuo entendimento da interação entre as fronteiras do discurso educacional, o educador passa a compreender as práticas discursivas que se alinham pelos saberes pedagógicos, pelos saberes políticos, pelos saberes culturais, pelos saberes transversais (interdisciplinares) que trazem relevância social à prática do educador quando este faz de sua representação o elemento intelectual que promove novos agentes culturais para multiplicarem os processos de enfrentamento à cultura dominante.

Para tanto, é preciso pensar a prática docente como uma prática reflexiva que dê ao educador capacidade de perceber o seu ofício de professor com a percepção da profissionalização, dando-o como acesso ao status da profissão, a propriedade laboral, política e social. O próprio Perrenoud (2002) levanta essa questão e a amplia para focar a profissionalização como um dos elementos principais para se alcançar a razão pedagógica.

E, para ampliar o referencial do contexto exposto, faz-se necessário pensar nas questões que Henry Giroux problematizou para o lugar social do educador pelo trabalho intelectual através do esforço de compreensão da formação do formador de opinião: Quais são as variantes morais segundo as quais construiremos a nós mesmos como agentes sociais de mudançaDe que maneira podemos nos reposicionar enquanto educadores contra a cultura dominante a fim de reconstituir nossas próprias identidades e experiências e aquelas de nossos estudantes? Como podem os educadores construir um projeto pedagógico que legitime uma forma crítica de prática intelectual? (2002, p. 124).

Diante do exposto, é notório pensar no contexto educacional da sala de aula como um espaço interdisciplinar onde se aprende assuntos de relevância social capazes de criar novas perspectivas para os efeitos práticos da dominância cultural pela ideologia vigente. Por isso faz-se importante perceber que com a evolução tecnológica e a popularização do computador, bem como da internet, o ser humano passou a ter um novo espaço para buscar o conhecimento. Nesses espaços multiculturais conhecidos como ambientes virtuais de aprendizagem se aprendem desde técnicas militares a operacionalidade de uma bolsa de valores. Aprendem-se as leis da química e da física sem a necessidade de ir a um laboratório. Com efeito, a escola passou a ser coadjuvante no ato de educar, deixou de ser o cenário principal e o professor muitas vezes mal-informado, sem vínculo com outros meios de comunicação, deixou de ser guardião do conhecimento, passando a condição de “parceiro” nesta incansável busca. Se a escola não mais é o cenário único de aprendizagem, então para que existe escola ainda? Porque não se extingue as escolas e passam a formar em seu lugar centros de informática onde o aluno se conecta nas redes sociais, faz a leitura dos assuntos, faz exercícios e vai jogar bola?

A ideia não é ruim, nem nova. Muitos autores já escreveram sobre o assunto, porém não se pode esquecer que o objetivo da educação é formar o homem para a vida em sociedade e para o trabalho. Nisto, a escola torna-se com seu projeto pedagógico, esse lugar socializador onde alunos, professores e comunidade, interagindo, produzem cidadãos preparados para a vida social, seja qual for a sua realidade. Esse papel é tão importante quanto aprender ou ensinar a geografia física do Brasil.

Um dos maiores desafios da educação nesse milênio é ensinar os alunos a apreender conteúdos, formar suas convicções e esboçar soluções, pois este será o dilema maior que enfrentarão fora dos muros da escola e da Universidade. Outro desafio preponderante que se coloca para melhorar o ensino quer seja na zona urbana quer seja na zona rural é pensar nas três principais perspectivas para se alcançar o ensino de qualidade: pensar no inchaço do currículo, pensar na profissionalização que atente ao estatuto da profissão, pensar no domínio técnico.

Mas para se conceber uma escola no campo ou na zona urbana que ensine para a vida, é necessário que se tenha professores reflexivos, que tenham conhecimento do seu papel social, que queiram redescobrir a cultura de cada um no seu lugar de origem. É preciso também ter uma educação de qualidade que torne seus profissionais reconhecidos e valorizados, senão se produzirá pessoas desiludidas, ensinado às pessoas desacreditadas, vivendo um eterno mal-estar cotidiano. Este modelo de educação muda a percepção de profissionalização do professor, dando a ele o acesso ao status da profissão. A pesquisadora Maria Alice Setubal afirma que “a qualidade da educação é proporcional à qualificação dos professores”. (2011, p. 34).

A própria Setubal denuncia a ingerência de muitos economistas no território político da educação e aponta outro problema: “[...] na maioria dos casos, as análises ficam restritas aos números e não foca a sala de aula. Por isso, acho ser preciso colocar os educadores em pé de igualdade com os economistas. Não se trata de uma competição para definir quem sabe mais, nem mesmo de uma abordagem quantitativa versus outra qualitativa. A contribuição dos professores é o olhar que incide no pedagógico. [...] Uma mobilização para resgatar o valor simbólico da profissão. Hoje, as pessoas praticamente pedem desculpas ao dizer que lecionam. Precisamos aproveitar esse momento em que é crescente a percepção da sociedade sobre a relevância da educação. [...] Não podemos esquecer o professor e o estudante. Não faz sentido só olhar para aspectos mais periféricos, como a gestão, e achar que tudo será resolvido.”. (2011, p. 36).

Assim, o contexto das competências está relacionado ao “saber fazer” e a busca por novas metodologias e novas formas de ensinar ao resgatar os valores culturais de cada aluno, de cada comunidade.  Ao ensinamento voltado para a exemplificação e, sem dúvida a ânsia pelo novo, porque o educador precisa estar aberto diariamente para novas aprendizagens. Só assim poderá ser capaz de ensinar e aprender a se colocar dentro da efervescência virtual que tanto tem caracterizado essa nova época. 

Os pilares da educação para o novo milênio se mostram favoráveis ao contínuo aperfeiçoamento dos quatro eixos norteadores e fundamentais para a formação: aprender a fazer, ser, conviver e aprender a apreender para efetivar um ensino que venha sanar a dívida que o sistema educacional tem com nossas próprias incertezas históricas. (UNESCO, 2002. – In: Relatório “Educação, um tesouro a descobrir”).

A escola, os professores e os alunos devem, antes de tudo, estarem sintonizados com a informação. Essa é uma exigência espontânea que se faz necessária nas instituições que tratam da moral social e sobretudo, da educação. Os tempos estão cada vez mais agitados e a escola deve acompanhar de forma salutar essas transformações, revivendo e reestruturando novos e antigos conceitos/axiomas que dão possibilidade à vida em sociedade. O conceito de ética, moral, estado, religião e relações de trabalho estão sendo desafiados e contestados pelos avanços genéticos, pelas inovações tecnológicas disfarçados em grandes blocos informativos que viajam em forma de arquivos através dos ambientes virtuais de aprendizagem. Essas são vertentes que têm modificado a natureza das relações entre as pessoas em todos os seguimentos institucionais e a escola deve orientar a reflexão sobre essas mutações e assim estabelecer uma educação reflexiva com alunos e professores reflexivos, afinal a formação dos sujeitos é o reflexo da sociedade onde ele está inserido.

Diante do exposto, percebe-se que os Desafios da Educação para o Século XXI, enfrentados pela escola no campo ou na zona urbana, em suas linhas mais gerais, a escola deverá enfrentar as incertezas desses territórios sociais para trazer a realidade para dentro da sala de aula, dando outro sentido para o fazer intelectual pelo trabalho racional. 

Paulo Freire (2002) chama a atenção para a necessidade de se pensar o papel da escola em uma sociedade em transformação, e diz que é preciso conhecer a realidade para oferecer o estudo dos conteúdos específicos historicamente constituídos e compartilhados, buscando compreendê-los para possibilitar ao aluno a compreensão do mundo em que vive através do processo de humanização que constitui o ser humano na sua plenitude, transformando sua vida e colocando os conhecimentos a serviço da construção de uma realidade melhor, mais justa, solidária e plena.

Freire também pensa no papel do professor como sujeito histórico de transformação e afirma ser necessário acreditar na possibilidade de mudança sendo de fundamental importância que este sujeito seja portador da esperança para assumir a condição de sujeito histórico de transformação da realidade escolar, articulado à realidade social mais ampla. Ser um sujeito transformador é estar em permanente construção para se tornar aprendiz e mediar a realidade enfrentada pelo aluno versus o conhecimento que se processa no amplo despertar pela busca do próprio conhecimento, favorecendo as aprendizagens do aluno rumo ao percurso de construção do ensinar para aprender, e impreterivelmente, o educador tem que ser um eterno mediador.

 

 Ω

 

 Referências Bibliográficas.

 

ALARCÃO, Izabel. Escola Reflexiva e Nova Racionalidade. – Rio de Janeiro: GRAAL, 1985. 

BRZEZINSKI, Iria. “Políticas Educacionais: Diretrizes Curriculares para Formação de Profissionais da Educação Básica”. In: ANAIS do 22º ENEPe. – Salvador, 2002. Discurso proferido na Mesa Redonda “Formação de Professores”.

DOLORS, Jacques. (et al). Educação - um tesouro a descobrir: relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. – São Paulo: Cortez; Brasília/DF: MEC: UNESCO, 2002.

FARIAS, Gênesis Naum de. Núcleo de Estudos Foucaultiano: Interpretações de Pesquisa Educacional em Convivência com o Semiárido. – São Paulo: Scortecci, 2017.

______. “As Incertezas Humanas no Mundo Globalizado”. In: Núcleo de Estudos Foucaultiano: Interpretações de Pesquisa Educacional em Convivência com o Semiárido.  – São Paulo: Scortecci, 2017, p. 31-34.

FARIAS, Enos André de. “Nosso papel para que tenhamos uma escola reflexiva”.  In: Diário da Região.  Juazeiro/BA, 2005, p. 02. 

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 38ª. ed. – São Paulo: Paz e Terra, 2004. 

______. A Educação como Pratica da Liberdade.  Petrópolis: Vozes, 2002. 

______. Pedagogia da Esperança. – São Paulo: Paz e Terra, 2019. 

______. Pedagogia da Autonomia. – São Paulo: Paz e Terra, 2006. 

______. Educação e Mudança. – Rio de Janeiro; Paz e Terra, 1979. 

______. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. – São Paulo: Paz e Terra, 1996. 

______. Jornal Folha de Produção. – São Paulo: Artigo de Kutzner, 2006, p. 01. (Acesso em 07/06/ 2010.). 

______. Ação cultural para a liberdade e outros escritos. 14ª. ed. – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011. 

______. Professores reflexivos em uma Escola Reflexiva. – Porto Alegre: ARTMED, 2002. 

GIROUX, Henry A. Os Professores Como Intelectuais. – Porto Alegre: ARTMED, 2002. 

______Cruzando as Fronteiras do Discurso Educacional: novas políticas em educação. – Porto Alegre: Artes Médicas, 1999. 

LACAN, J. Escritos. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998. 

MARTINS, Ana Rita; MOÇO, Anderson. “O novo perfil do professor”. In: Revista Nova Escola. – São Paulo: Outubro de 2010, p. 47-53. Disponível em www.ne.org.br. 

PERRENOUD, Philippe. A Prática Reflexiva no Ofício de Professor: Profissionalização e Razão Pedagógica. – Porto Alegre: Artmed, 2002. 

SETUBAL, Maria Alice. “A qualidade da Educação é proporcional à qualificação dos professores”. In: Revista Nova Escola – São Paulo: Abril, 2011, p. 34-38. Nota de Entrevista.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

quarta-feira, 17 de março de 2021

 1] Boletim Informativo do Núcleo de Estudos Foucaultiano. Ano 9 – Nº 0005 Março/ 2021 – São Raimundo Nonato.


 Paper. 

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: Um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. – São Paulo: Paz & Terra, 2020.  

 

A Pedagogia da Esperança 

como paradigma para o oprimido.


Gênesis Naum de Farias.


Professor Auxiliar II do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia na Universidade Estadual do Piauí – UESPI/ Campus Ariston Dias Lima - São Raimundo Nonato, 
onde coordena o Núcleo de Estudos Foucaultiano.

 



Certa vez, Paulo Freire foi indagado por um amigo com uma pergunta voraz: “[...] mas como, Paulo, uma pedagogia da esperança no bojo de uma total sem-vergonhice como a que asfixia hoje o Brasil?”. Paulo Freire responde a indagação de seu amigo, professor universitário, afirmando: “Não entendo a existência humana e a necessária luta para fazê-la melhor, sem esperança e sonho. A desesperança nos imobiliza e nos faz sucumbir no fatalismo. Não sou esperançoso por teimosia, mas por um imperativo existencial e histórico.”.

Paulo Freire ficou conhecido no meio acadêmico como o “Educador do Mundo” por transpor sua carga emocional para a análise profícua das relações humanas na condução dialógica da educação como forma de projeção de outra mentalidade para o mundo globalizado, no que tange as tramas e os fatos que conduzem as relações de poder na luta de classes pela afirmação de sua representação em marcha. Ele foi o exemplo vivo da esperança, incorporado pelo pensamento coletivo, pois elaborou uma obra e a projetou no seio de uma comunidade imobilizada pelos vetores dos fenômenos do multiculturalismo, lançando as bases de uma educação plural que viesse atender os direitos coletivos e que estivesse a serviço da cidadania.

Em Pedagogia do Oprimido, sua obra máxima, Paulo Freire reflete o seu comprometimento com a vida, porque nela encontramos os seus pressupostos político-filosófico-humanístico e a exaltação de um grito de libertação digno de um arauto conscientizador capaz de resistir a todo e qualquer fato histórico. A análise desta obra conclama todos os educadores a refletir sobre a comprometida vida de Paulo Freire frente aos descaminhos históricos enfrentados pelo ser humano, e ao observá-la sob uma ótica diferente, é possível encontrar os elos que fortalecem a relação do educador com o seu educando e com a cultura escolar, porque a mesma impõe sua relevância ao dar sentido aos experimentos do senso comum para adorná-los como algo que deve ser reinventado de forma respeitosa, cautelosa e muito criteriosa, ao passo que é composta por pessoas em seus lugares de memória.

O esforço humanizado que a torna uma ferramenta da prática pela liberdade consciente, consiste na ideia de fazer o educador se transformar num intelectual reflexivo, e a elocução preterida por Paulo Freire como homem sonhador e esperançoso o fez tecer os nortes para uma educação que precisava ser conjugada pelo aparato político ao se transformar numa educação contextualizada. Paulo Freire era um ser transcendente e sua escrita não só repensa o próprio homem, como também o faz pensar no homem que o é: “não sou se não deixas eu ser, não sou sobretudo, se não me deixo ser.”.

A pedagogia idealizada para o oprimido é um modelo de educação em movimento que busca a interiorização do ser social como interventor e problematizador no seu meio social. Numa sociedade cada vez mais dominada pela marca da exclusão e do controle moral do homem pelo homem, os métodos dessas formas de opressões jamais podem levar o homem consciente a se libertar de sua sina de dominado, mas ao ter uma educação que o norteie à prática da reflexibilidade, este pode vir a ser livre e pensador de suas causas ou infortúnios, podendo libertar outros seres humanos. Há nisto, o resgate de uma eterna dívida social com sua gente. Afinal os caminhos que o podem levar à libertação também o podem transformar em um sujeito opressor.

Com base no seu pensamento e nos pressupostos que defendia se pode entender o fracasso escolar como algo estabelecido bilateralmente para promover as bases de uma educação sem compatibilidade pedagógica. O cenário de suas elucubrações filosóficas aponta para uma nova tendência estética na cultura escolar, que congrega não só o aporte da hibridização de formas, gêneros e temas, mas também a consciência de um novo paradigma sugerido com a instabilidade dos acontecimentos, tendo que tratar com mais resistência o novo mapa da realidade social e política, comumente elaborado pela contemporaneidade, porque a partir dos desmanches de fronteiras do conhecimento e do esvaziamento das marcas culturais, tendo como resultante o predomínio do discurso descontextualizado em detrimento do letramento como elemento de expressão, ocorreram fortes perdas nas referências humanísticas produzindo assim sérios danos identitários.

A educação sem uma ação direta com a identidade e a sobrevivência dos indivíduos é incompatível com uma pedagogia que de maneira mistificadora camufla a existência do homem em suas práticas; neste caso, dificilmente se encontrará caminhos de liberdade que não seja os da dominação. Se a prática da liberdade não estiver aliada a uma educação que leve o homem à reflexão, à descoberta e à conquista, não tem sentido chamá-la de vetor de libertação, posto que teremos o retorno da velha idealização de um paradigma bancário reprodutibilista que sempre operou nas bases do aparelhamento das desigualdades.

Na verdade, esta insígnia é fruto de algo estagnado inconscientemente na cabeça de todos aqueles que se deixam representar por fascistas cheios de discursos salvíficos e com bom vocabulário. Assim aprendemos, assim reproduzimos, e assim pensava Paulo Freire ao se reportar ao saber cultural das pessoas e das sociedades na sua apaixonante vida de Educador: “A pedagogia do Oprimido é, pois, libertadora de ambos, do oprimido e do opressor.”. O Educador deve traduzir estas palavras para seu campo de atuação de forma a tornar público suas angústias e formar o cidadão para o mundo. Mundo este, cada vez mais desumano, injusto e vulnerável.

O lúdico saber sócio pedagógico tem que ser compartilhado com o coletivo, alongando-se e dando nitidez cada vez maior ao confronto real, enlevado por uma profunda intuição como vocação humanística para inverter no processo histórico aquilo que deforma a consciência humana, ou aproveitando uma sugestão de José Ortega y Gasset: o processo em que a vida se insere deve se impor como uma biografia em movimento. Talvez este seja o maior sonho do analfabeto funcional: aprender a escrever sua própria história, e como autor, se tornar testemunha e coprodutor de sua própria existência no mundo.

Diante de tudo que fora elucidado, só é percebido uma saída como dinâmica a se desenvolver (já antes desenvolvido como legado): colocar a própria pedagogia como estudo de libertação do oprimido, deste que se faz antropologicamente, a caminho e em marcha.

Para entender as grandes marcas deixadas pelo olhar de Paulo Freire no processo de conscientização, é necessário fazer a ação transformadora pretender enxergar os muitos esfarrapados, lançados à própria sorte, alcançarem uma centelha de luz capaz de ser possível ver estes conseguir desenhar suas próprias trajetórias. Para o Educador do Mundo, alfabetizar é antes conscientizar, por isso que o domínio se dá pelas palavras e pelos discursos, como também o inverso disto se dá pela leitura e pela formação de palavras.

O método contido em sua obra é referência ao que de conhecimento o educando já possui, porque parte do princípio de que uma realidade particular é capaz de transcender a uma particularidade coletiva, podendo alcançar o seu anseio por melhoria de vida e letramento vocabular num universo imagético que gira ao seu redor e tenta a todo instante lhe tragar como presa. A isto, enfatiza-se a importância do letramento crítico.

As palavras geradoras utilizadas pelo método Paulo Freire, combinam elementos básicos da vida do educando, e o faz ver que mesmo excluído, ele possui elementos semânticos que são constituídos no dia a dia através de uma sociedade letrada, e, a partir desta reflexão, seu universo se (re) configura com situações existentes num plano mental, fazendo-o crer em possíveis mudanças, medidas pela objetivação plástica da realidade.

Portanto, a pesquisa prévia deste compêndio, faz brotar esperanças e novas compreensões de que a Educação de Jovens e Adultos trabalhada numa perspectiva catalisadora e rejuvenescedora da educação e da sociedade, ainda pode fazer a diferença quando o assunto é inclusão social e distribuição de renda. Contudo Paulo Freire nos remete a ideia de sermos missionários da comunhão humana num mundo em que se instaura a cada hora, o processo de desumanização, cabe pensar ser possível humanizar-se com saber, prudência e ética.

Ao verificar na América Latina o pleno avanço das forças neoliberais que atendem pelos interesses do mercado e fazem das relações com a política uma forma de entrega do social às demandas do capital especulativo, é possível verificar a relevância do pensamento freiriano no aspecto contemporâneo do conflito pelo direito à cidadania, quando a insegurança jurídica implica outras formas de controle.

Nisto, é factual a percepção de que a realidade não apresenta sinais de mudança com os fatores históricos desencontrados, desconstituídos e desconectados, ou melhor, suas modificações ao longo da própria história passam por pequenas modificações, às vezes visíveis, mas quase sempre pautada pela invisibilidade ao se forjar no combate dos movimentos sociais outros anseios.

Nesta levada ideológica empreendida pelo fluxo de capitais dos grandes blocos econômicos, sobretudo após as mudanças ocorridas no Leste Europeu, veem-se a sustentação de um discurso autoritário e insurgente como anúncios de que se vive uma era de extremos, por isso decreta-se em termos de retórica o fim das utopias; esse pensamento é apregoado pelos neoliberais que propagam os seus desencantos com os modelos populares e socialistas. Esse pensamento não deixa de ser iníquo, na medida em que menospreza a luta de milhares de homens e mulheres que, animados pela esperança, numa humanidade emancipada, durante séculos empenharam suas vidas e sonharam com uma ordem social fundada na justiça social.

Extrai-se do exposto, que a solução para os grandes problemas enfrentados nesta modernidade tardia, cheia de paridades, marcada pelo desencontro entre a esperança do oprimido e os conflitos sociais, será postulada por outras formas de se perceber a mesma esperança como uma ferramenta de combate, buscando se contrapor ao desencanto apregoado pelo neoliberalismo, que insiste em desvirtuar a democracia, e propor um péssimo alento para os sonhos, pois do contrário, o mundo perderá a capacidade de esperançar por meio dos processos do saber cultural dentro de uma política que não se atenta para a construção de soluções mais efetivas para animar o espírito das causas sociais.

Quando se é proposto uma temática como esta, é porque se faz visível à criação de um novo modelo que se contraponha ao que é estabelecido pelo sistema global; um paradigma que promova rupturas no chamado “sono da razão”, para se pensar uma cultura educacional mais atenta àqueles que se sentem excluídos, e que no esquecimento, sonham com a liberdade não só dos próprios pensamentos, mas do próprio conhecimento, tendo em vista que os referenciais de singularidade estão se estilhaçando, frente ao descaso público para com a produção cultural em contrapartida ao que se é decido no âmbito das escolhas globais.

A cultura da indiferença neste país é gritante e tem sido assimilada pelo descaso, pois a trajetória deste manancial simbólico, produzido pelo brasileiro tem sido deixada de lado pelas políticas públicas, e, é preciso alertar para o caráter da produção de ideias que os movimentos sociais produzem. É preciso transformar a cultura local em algo que priorize a produção de um saber que venha reconstruir a identidade do povo e que leve esperança e traga de volta os sonhos e as liberdades cívicas.

Portanto, é preciso dialogar com os segmentos plurais da sociedade e integrá-los a uma política voltada para o desenvolvimento de demandas que atendam as infindas necessidades do cidadão comum. Enfim, é preciso visualizar na condução das mudanças o imperativo existencial do tempo histórico no seu tempo, no nosso tempo e no tempo do outro como um ato político de expectação...

 

 Referências Bibliográficas.

 

ALARCÃO, Izabel. Escola Reflexiva e Nova Racionalidade. – Rio de Janeiro: GRAAL, 1985. 

BRZEZINSKI, Iria. “Políticas Educacionais: Diretrizes Curriculares para Formação de Profissionais da Educação Básica”. In: ANAIS do 22º ENEPe. – Salvador, 2002. Discurso proferido na Mesa Redonda “Formação de Professores”.

DOLORS, Jacques. (et al). Educação - um tesouro a descobrir: relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. – São Paulo: Cortez; Brasília/DF: MEC: UNESCO, 2002.

FARIAS, Gênesis Naum de. Núcleo de Estudos Foucaultiano: Interpretações de Pesquisa Educacional em Convivência com o Semiárido. – São Paulo: Scortecci, 2017.

______. “As Incertezas Humanas no Mundo Globalizado”. In: Núcleo de Estudos Foucaultiano: Interpretações de Pesquisa Educacional em Convivência com o Semiárido.  – São Paulo: Scortecci, 2017, p. 31-34.

FARIAS, Enos André de. “Nosso papel para que tenhamos uma escola reflexiva”.  In: Diário da Região.  Juazeiro/BA, 2005, p. 02. 

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 38ª. ed. – São Paulo: Paz e Terra, 2004. 

______. A Educação como Pratica da Liberdade.  Petrópolis: Vozes, 2002. 

______. Pedagogia da Esperança. – São Paulo: Paz e Terra, 2019. 

______. Pedagogia da Autonomia. – São Paulo: Paz e Terra. 2006. 

______. Educação e Mudança. – Rio de Janeiro; Paz e Terra, 1979. 

______. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. – São Paulo: Paz e Terra, 1996. 

______. Jornal Folha de Produção. – São Paulo: Artigo de Kutzner, 2006, p. 01. (Acesso em 07/06/ 2010.). 

______. Ação cultural para a liberdade e outros escritos. 14. ed. – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011. 

______ . Professores reflexivos em uma Escola Reflexiva. – Porto Alegre: ARTMED, 2002. 

GIROUX, Henry A. Os Professores Como Intelectuais. – Porto Alegre: ARTMED, 2002. 

______Cruzando as Fronteiras do Discurso Educacional: novas políticas em educação. – Porto Alegre: Artes Médicas, 1999. 

LACAN, J. Escritos. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998. 

MARTINS, Ana Rita; MOÇO, Anderson. “O novo perfil do professor”. In: Revista Nova Escola. – São Paulo: Outubro de 2010, p. 47-53. Disponível em www.ne.org.br. 

PERRENOUD, Philippe. A Prática Reflexiva no Ofício de Professor: Profissionalização e Razão Pedagógica. – Porto Alegre: Artmed, 2002. 

SETUBAL, Maria Alice. “A qualidade da Educação é proporcional à qualificação dos professores”. In: Revista Nova Escola. – São Paulo: Abril, 2011, p. 34-38. Nota de Entrevista.